1/19/2004

Rotina

Às sete horas e quatro minutos da manhã de segunda feira entro no comboio que me leva para mais uma semana de trabalho.
Enrosco-me no meu lugar para ficar mais pequena e vou ocupando o meu tempo assistindo a mais um "render da guarda celeste". Após uma série gradual de variações policromáticas no céu, que vão do azul esmorecido ao laranja forte quase sangue, a lua acaba por dar definitivamente lugar ao sol por volta das oito horas da manhã, sobre uma qualquer planície pantanosa ainda sul e Tejo. Vou ouvindo algumas conversas de circunstância que se passam à minha volta como se fossem ecos de longe: "Este comboio vai cheio, o Porto é mesmo uma grande cidade!" ou "Em Espanha os comboios não é nada disto" e, invariavelmente, adormeço.
Acordo já rodeada dos pinheiros bravos e dos eucaliptos do norte, as casinhas de azulejo já minhas conhecidas, do subúrbio da minha cidade, indicam-me que está na hora de vestir o casaco e pegar na mala.
E o pior de tudo isto é que, na Gare do Oriente, deixei acenando-me um adeus pouco convicto, a minha alegria de viver, suspensa até ao fim de semana seguinte.
Mas não sou infeliz. Tenho no olhar e nos braços e na voz de outra pessoa um conforto imenso e um amor recíproco. Quem se pode gabar de ter isto?

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