10/20/2006

TIQUES


As pessoas andam no supermercado como se estivessem no Prado, ou no Louvre. Páram, olham, põem um ar inteligente e dão uns passos atrás, para melhor poderem admirar a matéria exposta.
Andam também no supermercado como se tivessem o poder de dominar a matéria com a mente. Ficam no meio do corredor a olhar fixamente uma embalagem de rolos de papel higiénico até ela levitar, sem se desviarem um centímetro sequer, mesmo que haja vários clientes inocentes a querer passar.
As pessoas também andam no supermercado como se estivessem numa festa. As famílias encontram outras famílias, completas com filhos, pais, mães e até avós e sogros, e não saem dali enquanto cada um deles não troca beijinhos com os outros todos, à vez, numa espécie de dança em que cada um vai rodando para dar lugar ao seguinte, e perguntam como estão e deixam de estar sem no entanto esperarem qualquer resposta. Às vezes falam também de futebol ou da vida privada de um ou outro conhecido que não se encontra presente.

Se juntarmos a isso o facto de quase todos trazerem carrinhos de compras e os corredores serem mais estreitos do que os dos museus, bem como o facto de nós, muitas vezes, estarmos cheios de pressa para sair dali, descobrimos o que é que faz dos supermercados o pior sítio para passar um bocado a seguir a hospitais e consultórios de dentistas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu acho que há um fenómeno psicológico qualquer, que faz com que as pessoas se anestesiem na presença dessa oferta excessiva que inunda os sentidos. Ainda por cima com aquela música ambiente estudada. É uma forma dopante de ultrapassar algumas frustrações, certamente. Alí o povo mergulha de cabeça. Mas, o sítio mas engraçado, é o local onde estão as revistas "cor de rosa". Aí sim é vê-los a consumir avidamente a dose do momento, até porque é gratuito!