11/08/2007

E A PROPÓSITO DUM COMENTÁRIO NO POST DE 6/11, LEMBREI-ME DISTO


Nos inícios dos anos 80 em Aveiro, o Cine-teatro Aveirense, agora elevado à categoria de local para exibição de peles e pseudo-sensibilidades artísticas, exibia à meia-noite de sábado sessões de cinema porno. A vossa padeira andava pelos vinte anos e morava mesmo ao lado, e um dos seus passatempos preferidos era ir para a janela assistir ao movimento espontâneo dos apreciadores. Em mais nenhuma ocasião se via (e ouvia) tanta Famel Zundapp e Casal Boss junta, parecia uma convenção. Surgiam em hordas de todos os subúrbios desconhecidos, na maioria dos casos homens sozinhos mas também alguns casais, elas no lugar do pendura. Invariavelmente, os últimos a chegar já não arranjavam bilhete porque os 900 lugares não eram suficientes para todos os fãs do género e lá vinham eles de volta à motorizada largando audíveis “foda-ses” de frustração. Já depois do filme começar e reposto algum sossego, havia lugar à segunda parte do espectáculo: Passava o camião do lixo da Câmara pela estreita rua inundada de motas e os trabalhadores vinham à frente, batedores improvisados, desviando veículos para permitir a passagem. Ouvia-se “um, dois, três… vai!” e por vezes até um ou outro carro era desviado em peso. Mais tarde acabava o filme. A inspiração acumulada durante a sessão obrigava os pequenos motores de 50cc a arrancar de súbito e mais estridentes do que antes. Vistos de cima, pareciam um enxame de zangões em fúria. Até que o último desaparecia e a rua estreita voltava a dormir pachorrentamente até à manhã seguinte. Só nessa altura eu ia dormir, depois de apreciar e me divertir com todos os detalhes.
Mas chegou inevitavelmente o dia em que a repetição levou ao cansaço e eu decidi que queria mais. Queria ver lá dentro, in loco. Dito e feito, comprei um bilhete e fui ver uma sessão. Não tenho a menor recordação do título do filme, nem dos actores, nem do argumento se é que existia algum. Só me recordo nitidamente de ver à minha volta vários espectadores que viviam a emoção da sétima arte com a mão dentro das calças e mesmo na fila atrás de mim fazia-se um bico à descarada. Foi mau. Porque nunca mais consegui assistir a uma sessão das “normais” sem pensar bem no que já teria acontecido à cadeira onde me ia sentar.

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