Para quem nunca lá esteve e tencione estar, para quem pense ir ver ao vivo o David de Miguel Ângelo ou A Primavera de Boticelli, aqui vai um breve manual de sobrevivência:
1. Na Itália, os museus mais relevantes (ou seja, os que atraem mais visitantes), têm duas filas para entrar. Uma para as pessoas normais como eu e (acho) vocês, outra para os chicos espertos.
2. Na fila para as pessoas normais os bilhetes têm o preço normal. Por exemplo, 15 euros.
3. As pessoas normais, quando chegam ao museu, vêem que a fila normal não é assim tão comprida como isso, fazem umas contas de cabeça, concluem que irão entrar em cerca de meia hora e colocam-se no fim da dita.
4. Uns 5 minutos depois, no entanto, começam a passear-se ao longo da fila umas miúdas a apregoar a estranha frase "Skip the line!". Algumas das pessoas normais que estão na fila normal questionam a razão de ser daquilo e ficam a saber que, se quiserem passar para a fila dos "chicos espertos", devem comprar bilhetes a elas. O preço desses bilhetes poderá ir de 20 euros por cabeça (se a pessoa tiver ar de italiana, espanhola, tuga ou brasuca), a 45 se as moças entenderem que se trata de alguém dum país abastado. Cuidado loiros!
5. As pessoas normais mandam-nas pastar e continuam na fila, porque era só o que faltava.
6. Uma hora depois, a fila das pessoas normais continua imóvel ou, quando muito, avançou uns metrinhos. Mas já cresceu bastante e vai numa rua qualquer donde nem sequer se consegue ver o museu.
7. As pessoas que estão na fila normal pedem aos acompanhantes que vão lá à frente ver o que se passa na entrada, do género se morreu alguém, se houve um tremor de terra e caiu uma pedra imensa em frente à porta ou se o museu foi à falência e entretanto fechou.
8. É nesta altura que as pessoas da fila normal descobrem que, na entrada normal, não está a entrar ninguém. Que inclusive o porteiro que lá devia estar foi comer, foi à casa de banho ou foi visitar a prima ou a p... que o p... Já a outra fila (aquela dos chicos espertos que compraram os bilhetes às ragazzas) anda que se farta e não há praticamente espera.
9. As pessoas da fila normal ficam perplexas, comentam entre si o que se está a passar e que nunca tinham visto nada assim em parte alguma do planeta. No entanto, as mais honestas continuam a achar que não vão alinhar naquele esquema nem que a vaca tussa e mantêm-se na fila.
10. À medida que a fila avança (pouco e durante horas), as pessoas normais vão vendo inscrições na parede ao seu lado, de outras pessoas que lá estiveram antes e já estavam a ficar, em bom português, f*didas com aquilo. Essas inscrições vão do "only 3 hours from here my friend" até ao desenho duns caralhetes bem torneados.
11. As pessoas normais acabam por concluir que, ou alinham ou não entram no museu, o que depois de ter apanhado um avião e feito milhares de quilómetros é um bocado chato, e lá chamam uma gaja daquelas para lhes venderem um bilhete daqueles que alguém dentro do museu (e que também come uma parte com toda a certeza) lhes orienta para elas venderem cá fora. Conclui-se também que o facto do porteiro passar o dia com ataques de c*ganeira é uma cena propositada para o pessoal desistir de entrar a bilhetes de 15 euros.
12. Quando acabam por conseguir entrar no museu, as pessoas normais já vão com uma neura que só lhes apetece começar a fazer às peças o que o Mr Bean fez à Mãe de Whistler ou pior, pelo que acabam por já não ver nadinha e limitar-se a procurar por um livro de reclamações que não existe porque na Itália não é obrigatório.
13. Quando vão ao museu seguinte as pessoas normais, apesar de muito lhes custar, já nem se põem na fila. Vão directas a uma gaja daquelas e dizem-lhe logo que não dão mais do que 20 euros e que ela se ponha fina.
E é assim que a gente conclui que não faz parte da pior raça de intrujas que há no mundo e fica até a gostar um bocadinho da pátria-mãe. Por outro lado, descobre-se também como é que um mastronço como o Berlusconi consegue ganhar eleições, o que é duplamente didáctico.
E pronto. Mais tarde ensinar-vos-ei a sobreviver em Roma como peão.